Avançar para o conteúdo principal

Os olhos da alma

Existem olhares que matam. Não matam a vida mas matam o coração e a alma. Hoje estou neste comprimento de onda. A pensar na importância que os olhares têm. Eu, que sou uma pessoa cheia de palavras e que adoro este tipo de expressão, sou uma franca apreciadora de olhares. Não só de olhares como também de todo o conjunto de formas não verbais de comunicarmos uns com os outros. Da mesma forma que o nosso subconsciente e o nosso coração são muito mais inteligentes que o nosso cérebro e que a nossa racionalidade, o não verbal expressa muito mais sinceramente o que o outro está a pensar ou a sentir. E o olhar é majestoso nesta forma de comunicar. Penso que existem olhares que salvam e olhares que condenam. E não são necessárias quaisquer palavras a acompanhar o que se diz com os olhos. 

Neste momento tenho os pensamentos a mil à hora (o que não é difícil, tratando-se de mim). E penso nestas coisas dos olhares. Da importância que tem olharmos os outros, olhos nos olhos, de igual para igual. Sem ser de alto nem baixo para cima. E o olhar não depende do tamanho dos olhos. Depende do tamanho do nosso coração, do nosso carater e da nossa nobreza. Se dependesse do tamanho do olho, eu estava tramada, até porque tenho uns olhos muito pequeninos. Não se vê muito lá para dentro mas vêem muito do que se passa cá fora. Nos velhos tempos, os homens mongóis quando escolhiam as companheiras, escolhiam sempre as que tinham os olhos mais pequeninos. Isto porque acreditavam que assim, o mal não poderia lá entrar. Acreditavam que o mal pode entrar pelos olhos das pessoas e tomar conta delas. Invadi-las. Muito interessantes, estas crenças, não são? Também me parece. De facto, o mal pode entrar pelos olhos adentro. Principalmente se o virmos nos olhos dos outros. Principalmente se nos sentirmos criticados, julgados e rebaixados pelos olhares das outras pessoas.

Eu acredito que os olhares têm muito poder. Para o bem e para o mal. Por isso gosto tanto de saber das antigas (e atuais) crenças relativas ao poder dos olhos e do olhar. Como também adoro a pureza e a simplicidade, procuro saber umas coisinhas aqui e ali sobre antigos povos, ou sobre grupos/ comunidades de pessoas mais ligadas à natureza e mais próximas da sua essência. Não tão sofisticadas ou "civilizadas". Aprende-se tanto com quem é humilde e não pretende reunir a sabedoria do mundo...e em quase tudo aquilo que me lembro de ter ouvido falar ou de ter lido, os olhos são sempre, de uma forma ou de outra, o espelho da alma ou a porta de entrada para a nossa interioridade. E existe sempre um poder qualquer ou uma energia associada aos olhos e ao olhar. 

Ando a dedicar-me a este assunto. A refletir um bocadinho sobre isto. Sobre a transparência do olhar. Sobre como se sabe tantas coisas através do olhar das pessoas. Tenho uma cria que fala pelos olhos afora. E mesmo quando não quer falar sobre o que a mói, eu sei que algum bichinho lhe mordeu. Quando era pequenina, só pelo arregalar do olho, eu percebia que dali iria sair uma bomba! Normalmente uma pergunta inconveniente ou difícil...enfim, outros tempos que felizmente também deixaram muitas saudades. 

Tenho igualmente uma estrelinha na minha vida que também é só olhos. Tudo o que não diz por palavras, salta-lhe pelos olhos. Principalmente as emoções. A forma como se sente. A sua essência. As suas dores. As suas dúvidas. As suas barreiras. A sua alma garota. O peso da responsabilidade. O peso do que a acorrenta. Os medos. As lágrimas que chora para dentro. A compaixão. A tempera. A liberdade. Tudo isto se vê nos olhos. E é tão fácil ler olhos quando as almas já se conhecem. Quando os carnavais já são muitos. Como acredito na reencarnação, acredito que as pessoas se conhecem de outras vidas e que continuam a encontrar-se vida atrás de vida até cumprirem a missão que têm umas com as outras. Seja ela qual for. Só assim é que explico o facto de sentir aquelas sensações de familiaridade com esta ou aquela pessoa. Com a minha estrela, tenho quase a certeza que a conheço desde sempre. Por isso sou capaz de lhe ler os olhos. E se eu deixasse o meu coração e a minha alma interpretarem aquilo que os meus olhos vêem nos olhos da minha estrela, eu seria ainda muito mais justa e certeira. A chatice é que por vezes coloco a cabeça e a racionalidade a fazer leituras e estrago um bocadinho...se se conseguir deixar fluir as conversas entre olhares e entre corações, não há erro. Assim, usando a cabeça, existem dúvidas, receios e outras coisas que só atrapalham o conhecimento e a relação que as almas trazem. É que o que alma traz, a cabeça não se lembra. A nossa memória quase nunca consegue aceder à memória da alma. Às vezes consegue, mas apenas em momentos e circunstâncias muito especiais. Isto será tema para, quem sabe, uma outra conversa.

Se deixarmos fluir o que nos vem do nosso interior, se conseguirmos usar todas as nossas faculdade com a paz de espírito necessária, se conseguimos dar a devida atenção à informação a que acedemos interna e externamente, conseguimos ter uma noção mais exata de quem somos, para onde vamos e quem queremos que nos acompanhe. No fundo, conseguimos ir encontrando pequenos sentidos e significados para a nossa vida. Conseguimos colocar os pontos nos nossos "iis". Conseguimos ter a consciência de quem nos rodeia. Somos bem ou mal amados? O que vale e o que não vale a pena? E o que fazemos com o que conseguimos descobrir? Onde está a raiz das coisas? As verdadeiras causas? Quando queremos descobrir quem somos e que vida é que temos, Deus faz-nos a vontade e manda os sinais de luzes. E não há nada mais gratificante que é sabermos quem somos. Qual é a nossa essência. Este é o primeiro passo para tudo. Muitas vezes andamos a passear pela vida como se passeia ao domingo por uma marginal qualquer. Só a ver o que queremos ver, como se semana se resumisse naquele passeio. Descobrirmos o que somos sem disfarces e como são os que estão à nossa volta, tem um valor incalculável. Isto se acontecer de forma despida, sem artifícios, sem interesses e conveniências nos relacionamentos. Quando servimos os interesses de alguém, somos os maiores do mundo. Tratam-nos bem, com reconhecimento. Se o interesse desaparece, se o dinheiro acaba, se já servimos determinado propósito é que a coisa aperta! E os olhares dos outros mudam. Daí que é em tempos de escassez (da nossa) que verdadeiramente conhecemos os que nos rodeiam. Percebemos se verdadeiramente gostam de nós ou não. São nossos amigos ou eram amigos do bem estar que nós proporcionávamos? Os tempos de escassez são muito importantes na vida das pessoas. Colocam a nú quem nos rodeia. E, na maior parte das vezes, fazemos descobertas que doem até à ultima pontinha da nossa alma. Em continua abundância somos patitos alegres que não sabem nada do que se passa à sua volta. Apenas parece que se sabem. A alternância de estados, apesar de muito doloroso, faz-nos evoluir. Torna-nos mais conscientes, mais fortes e, normalmente, melhores pessoas. É com a escassez que aprendemos a valorizar a abundância. É na escassez que aprendemos a valorizar quem, de facto, merece esse valor. Bem sei que isto é fácil de dizer mas muito difícil de aguentar. Muito difícil, mas muito importante. A vida não é para ser vivida como uma ilusão patética em que andamos a fazer de conta que tudo é fantástico. A vida é para ser vivida no seu pleno. E a plenitude não existe sem a verdade nem a autenticidade. De que serve ter-se muita gente ao lado se estão lá por elas próprias e não por nós ou pelo prazer da partilha? Por isso é que quando as condições escasseiam, um dia, as pessoas acordam sozinhas. E admiram-se!!! 

O dinheiro e os bens materiais, não deixam de ser coisa maravilhosas. Mas são apenas o que são. Nunca se pode deixar que eles disfarcem a realidade nem que escondam os problemas. Há um provérbio que resume claramente o que quero dizer: "Não há nenhum homem rico que seja feio". Isto diziam as pessoas antigas relativamente ao poder que o dinheiro tem. Sempre tive esta frase na cabeça. E fez-me aprender que o dinheiro disfarça defeitos, maldades, faltas de amor, faltas de atenção e outras coisas que fazem muita falta aos corações. Por isso é que existem tantos peitos vazios em carteiras cheias. Mas cada um faz as suas opções relativas à importância que dá ao material e ao imaterial. Talvez valha a pena pensar um bocadinho sobre isto. Penso nisto muitas vezes particularmente quando vejo pessoas que eu adoro a levarem coices da vida para ver se aprendem o valor exato que as coisas e as pessoas têm. Para ver se fazem as opções corretas, principalmente no caminho da sua própria felicidade e para o bem da sua alma. Mas isto é uma linguagem que não se entende às primeiras. É preciso estar-se desperto para este quadrante na nossa existência para o podermos reconhecer e entender-se a sua linguagem. Mas não é por isso que cada um não faz o melhor de que é capaz. Até porque os coices da vida doem que se fartam. Doem tanto que cada um faz o melhor de que é capaz para encontrar caminhos que aliviem a dor. E na maior parte das vezes há muito pouco a fazer para ajudar as pessoas a encaminharem-se pelos caminhos menos tortuosos. Normalmente são os que não estão à frente do nariz e como tal, dão medo. E o medo trava a ação e as escolhas. E há escolhas que têm que ser feitas no mais intimo do nosso ser. Há coisas que só o próprio pode vivenciar.

É verdade, viver é uma ciência, particularmente se queremos cuidar bem da nossa alma, a tal que é eterna. A tal que se mostra todos os dias através dos nossos olhos. A tal que sabe infinitamente mais do que aquilo que nós sabemos. Daí que seja tão importante sermos intuitivos em vez de predominantemente racionais. Se a nossa alma sabe mais do que a nossa cabeça, porque não escutá-la? É muito mais sábia e complacente. Mais justa e verdadeira. 

Comentários

As mais lidas...

Corações à janela

De vez em quando o meu coração sai fora do peito. Deixa um lugar vazio. Cheio de nada. Vai espreitar à janela. Vai ver se existem outros corações como ele, a espreitarem, a ver se encontram o que lhes falta. Quando se espreita à janela de uma casa vazia, vê-se fora uma multidão que ainda torna mais vazia a casa da janela onde se espreita. A janela de onde o meu coração espreita tem uma vista colossal sobre a rua da amargura. Da janela vêem-se outros corações a espreitar. Uns despedaçados, outros partidos. Todos os corações inteiros e de saúde encontram-se dentro do peito onde pertencem. Quanto muito, passeiam de um peito ao outro quando se trocam palavras de amor. Não espreitam à janela de casas vazias. Mas uma casa vazia torna-se muito grande, muito solitária e muito fria para que um coração rasgado possa estar sozinho em paz a sangrar. Tem que se entreter e vai espreitar à janela. Tem que ver se encontra um outro coração com quem possa partilhar as mágoas. E faz adeus aos outros

In Extremis

Ele há dias murchos como o outono. Não gosto muito do outono mas ele não tem culpa nenhuma. Parece que o outono é muito mais triste dentro de nós do que fora. É inegável a beleza que tem. As cores das folhas que se prolongam pelo chão, o por do sol mais afogueado que nunca, as nuvens cheias de tufinhos de lã e a brisa do vento a refrescar-nos as ideias. Hoje repensei sobre esta coisa de não gostar do outono. E é principalmente porque é o prelúdio do inverno. Mas o outono não tem culpa nenhuma de ser o que é nem do que vem a seguir. Se eu soubesse efetivamente viver um dia de cada vez não rosnava ao outono. Saberia apreciar as suas belezas e as suas excentricidades. Ainda não consegui aprender a viver um dia de cada vez. Nem a tirar a murchice do peito independentemente do que possa acontecer. Ainda não aprendi a encarar cada dia que começa como se fosse o último. Isto parece um pensamento tolo mas não é. É um pensamento de grande sabedoria. Li algures, nem me lembro onde, mas relacion