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Perder o pio

As palavras são metade mim. Mas por vezes quase que as perco. Quando o coração me dói muito, quando a alma está toda esfrangalhada, as palavras andam cá por dentro às voltas na minha cabeça. Rodopiam, encontram todos os sentidos e mais algum mas perdem-se no rebuliço que a tristeza me dá. E fico quieta e calada. É o que se chama perder o pio. E quando uma pessoa como eu perde o pio, é porque a coisa está feia. Tenho estas dores que não me deixam sossegar. Nem me apetece falar delas. Acontece esta coisa sem senso nenhum que é apetece-me escrever para aliviar a pressão mas não consigo escrever sobre o que verdadeiramente me aflige. Talvez porque saiba que tudo está em aberto. Porque não sei para que lado as coisas vão. Também sei que apesar de estar tão triste, sinto alguma paz de espírito - outro contra-senso - que me diz que tudo correrá por onde for melhor. Que o Céu me acompanha. É esta confiança cega que tenho em Deus que me leva a fazer brotar sempre uma fonte de esperança por mais sombrio que o meu coração esteja. E cá me vou gerindo entre estes sentimentos e estas emoções. Entre estas contradições. Claro que gostava de ter uma confiança cega no Céu vivida com toda a serenidade e com toda a paz no coração. Mas ainda não evolui o suficiente para encarar as coisas dessa forma. Ainda não consigo aceitar tudo de forma pacificada. Ainda tenho que aprender umas lições nesse sentido. Por enquanto ainda me esgatanho por não compreender certas coisas nem certas atitudes nas pessoas. E eu sei, em consciência, que todos somos diferentes, levamos a vida de forma diferente, que temos formas diferentes de nos expressarmos, de fazermos as coisas e etc., etc. Também sei que sou esquisita e que os meus óbvios são muito complicados para outras pessoas e que as minhas complicações são óbvias para muitos outros. Apenas ainda não sou capaz de conjugar isto tudo sem me esturricar e sem deitar umas lágrimas. Na verdade são umas lágrimas mais resignadas. Menos atormentadas. Cada vez choro melhor. Também o chorar tem a sua ciência. Já não  choro lágrimas de sangue. Essas estão reservadas para ocasiões muito especiais. Aprendi que a impotência também é minha companheira de jornada, juntou-se ao duo das dores de coração e das saudades. Formam um trio maravilha. Por vezes parece-me que me falta arcaboiço para lidar com as três ao mesmo tempo. Mas tudo o que não têm remédio, remediado está. Não consigo fazer mais nada em certas situações. Não consigo fazer melhor. Ou não consigo encontrar a forma de fazer melhor, não está ao meu alcance. E já não me martirizo por isso, apenas sinto dor. Vou pedindo a Deus que me dê paz. Que me dê serenidade. Que me ensine a lidar com o fogo sem me queimar tanto. Que me ensine a lidar com o frio sem enregelar a alma. Que me ensine a proteger-me um bocadinho melhor até de mim própria, das minhas toneladas de amor, sempre em excesso, sem saber o que lhe fazer. Sem o conseguir escoar. Eu costumo dizer que o que dói não é o amor mas sim a falta dele. E é verdade. Mas o seu excesso no nosso peito sem ter onde o enfiar, também pesa. Também dói. Porque no fim da história, se ele não se escoa é porque não se tem quem o receba. Ou pelo menos não o recebem como se gostaria que recebessem. E como ninguém tem culpa do amor que temos e da forma como gostaríamos que o recebessem, só resta uma alternativa: doer. A grande aprendizagem que se retira deste tipo de dor é o desapego. Aprender a amar de forma desapegada. Amar o que se quiser, como se quiser, sem se esperar nadinha em troca. Amando os outros exatamente como são e onde estão. Como se o nosso amor fosse como o sol de um fim de dia de verão. Quentinho sem abrasar, aconchegante e carinhoso sem que se tenha que fazer nadinha com ele. Feliz só por ser um raio de sol de fim de dia de verão. Nunca mais lá chego...estou melhor mas ainda não estou nesse patamar. Já passei de um raio de sol do meio dia a pino para um das 4 da tarde. Mas ainda me falta umas horinhas até estar no ponto. Até toda eu ser calma e serenidade como um fim de dia de verão. Ainda tenho que dobrar a tempera. E dobrar a tempera dói que se farta. E pode-se perder o pio.

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