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Cansaço

Por vezes não consigo saber o que pensar. Os factos mostram-me uma coisa e o meu coração diz-me outra. Claro que eu sou muito dada a ouvir o que o meu coração me diz. Embora de vez em quando, ele, o meu coração, proteja mais as outras pessoas do que a mim própria. E eu fico um tempo à nora sem saber o que pensar, o que deduzir. Tenho horror a ser injusta com o que penso. Daí que me custe tanto quando estou numa fase de limbo relativamente a qualquer coisa ou a alguém. Por um lado tenho um impulso resolutivo e de saber o porquê das coisas. De saber as razões por detrás dos atos. De saber os sentimentos por detrás das ações. Mas temo sempre que o meu mau génio interfira na opinião que formo. E prefiro não fazer nada ou não dizer nada a ser injusta. A injustiça é talvez das coisas que mais me magoa e penso que também poderá magoar as outras pessoas. Mas também tenho muita dificuldade em andar neste carrocel emocional. Sem saber o que pensar ou o que sentir. A abrir e a fechar o coração. Qualquer dia tenho a fechadura estragada. Ou deixa de fechar ou deixa de abrir. E como é que estas coisas se substituem? Se eu estragar alguma peça no meu coração, como é que isto se repara? Quando o meu coração se parte, eu já sei como é. Fica partido até cicatrizar por si. Não volta a ser o mesmo, fica com a marca mas funciona em pleno. Agora outro tipo de peça que se avarie, não sei onde nem como se resolve. Não sei como se trata o cansaço, como se trocam as baterias. E sinto-me assim, sem saber o que pensar, o que sentir. Sem saber se me deixo ir pelo cansaço e desisto ou se continuo a fazer muita força e a seguir passo após passo e dia após dia. Voltando à fechadura que me protege o coração: se se abrir de vez e avariar o trinco, pode ser um Deus no acuda e sou incapaz de evitar qualquer dano ou partidela. Pode ficar destroçado à grande e à francesa. E depois? Não sei se tenho a energia para me recompor. Não me apetece passar pelo processo todo. Pelo menos, agora ainda não me apetece. Por outro lado, se o trinco não voltar a abrir, não sofro de partidelas mas vou explodir. Não consigo guardar tudo o que sinto lá dentro sem lhe dar vazão de vez em quando. É o chamado preso por ter cão e por não ter…

Ainda há a possibilidade de congelar um bocadinho o coração. Talvez resultasse e nos entretantos conseguisse ter um bocadinho de paz e de serenidade. E assim, a frio, talvez consiga ver melhor as coisas e, ao mesmo tempo, ser justa. Colocar-me numa pele diferente para ver a minha com o devido distanciamento. E para ver o que me atormenta também com o devido distanciamento. O distanciamento é muito importante para se ver as coisas com alguma frieza. Para colocar o coração no sítio. Para pensar com menos enviesamentos. Desde que a dor não nos tolde o julgamento. Desde que a ferida não sangre demais e a atenção se centre apenas na hemorragia em vez de ser no que nos faz sangrar. Hoje estou muito cansada para decidir o que pensar. Para encontrar uma razão para as coisas. Sinto-me talvez exausta de sentir tanto. De me emocionar tanto. De deixar que me doa tanto. Apetecia-me desligar o botão e não querer saber de nada. Mas não há botão. O único botão que conheço é aquele que naturalmente me deixa ir. Tudo o que não me segura, deixa-me ir com toda a facilidade. O que não me sabe agarrar deixa-me escorregar com toda a ligeireza. Sem espinhas. Eu esforço-me até à exaustão. Mas se não me prenderem eu descolo-me com muita facilidade. Até com facilidade demais. 

Também tenho um malvado de um feitio…apenas me interessa o que é oferecido com vontade, com amor. Não quero saber do que é feito a pedido ou por cobranças ou obrigação. Não gosto de pedir. Não gosto do que me é dado a pedido (emocionalmente falando, está claro). Não me interessa o que as pessoas fazem por obrigação. Interessa-me o que são capazes de oferecer de coração. Porque gostam de nós, porque se preocupam. Porque para elas também é importante que nós saibamos que somos queridos. Que moramos no seu coração. Querem saber como passamos, como anda a nossa vidinha. E que se lembram que também necessitamos de ser cuidados em vez se sermos apenas e sempre os cuidadores. Parece simples e evidente, não é? Mas não é…nada simples. Cada um pensa nestas coisas à sua maneira. Defende-se como pode. Reserva o que entende e andamos por vezes em desencontros que só nos magoam. Há quem diga que sou muito exigente com os outros. Talvez seja. Mas ainda não sou capaz de fazer melhor. Ainda me apetece que de vez em quando me mimem, só porque sim. E que me procurem porque me querem a mim, enquanto pessoa, e não porque precisam de mim para lhes resolver este ou aquele assunto ou problema. Ou para lhes dar uma opinião sobre qualquer coisa que tenha a ver com as suas vidas. Por vezes penso como será bom que nos olhem apenas por gosto, por amor, por interesse em saber de nós. Simplesmente porque gostam da nossa companhia e não apenas da nossa utilidade. E porque gostam de nós inteirinhas da silva e não só neste ou naquele contexto. Em que não somos enfiadas no meio da agenda a aproveitar o espaço vazio que aparece aqui ou ali. Como deve ser bom ter um bocadinho de tempo verdadeiramente dedicado. Só porque somos tão importantes como outra alínea qualquer da vida. Ou quem sabe, até mais importantes do que uma tarefa qualquer. Deve ser bom ser objeto de dádiva só porque sim, porque nos querem ver felizes. Porque gostam de ver o nosso sorriso e de ouvir a nossa gargalhada. Porque até sabem entender o nosso silêncio. Respeitam-no. E até talvez sejam capazes de aceitar o que não entendem em nós. Aceitar apenas porque gostam de nós e porque nos dão o benefício da dúvida. Às vezes canso-me de entender, de integrar, de compreender, de fazer aquilo que me parece que é o melhor para o outro. De mimar e de cuidar. De dizer coisas bonitas porque faz com o outro se sinta bem. Coisas de verdade, como é evidente. Se a justiça é importante para mim, a verdade também o é. Prefiro uma verdade dura a uma mentira suave ou doce. Detesto mentiras e por vezes também não gosto nada de desculpas doces. Adoro meiguices e doçuras. Mas irritam-me quando são apenas instrumentalizadas. Quando são usadas para me acalmar a fera. Para me amansar a tempera. Eu sei que a minha tempera não é pêra doce. Hoje em dia já é mais doce do que era. Já sei calar, conter. Em vez de deixar sair uns disparates, já sei sair de cena e conter a fúria. A fúria não ajuda nada nem ninguém. Apenas serve para disparar a raiva que temos no estômago. E a raiva só faz mal. A nós e para quem disparamos. Já estou muito melhor nestas coisas de puxar o gatilho. O que não consigo evitar são as tristezas. As melancolias. A tristeza não é boa companhia para nada. Não ajuda a pensar como deve de ser. Não ajuda a ouvir o coração. A tristeza apenas cansa. Exausta. E na maior parte das vezes nem se pode andar triste, tem que se disfarçar. Isto também me aborrece. Disfarçar o que sinto. Quando damos vazão às nossas emoções, estas tratam-se. Seguem o seu caminho. Se as mantemos cá dentro guardadas a fazer de conta que não existem, crescem e corroem. Hoje estou muito cansada para encontrar soluções e alternativas. Hoje apetece rosnar um bocadinho. Dizer uns palavrões. Maldizer a vida e ter pena de mim própria. Sempre afago o coração. Da forma possível. O inverno também não ajuda a animar. O sol faz-me muita falta. Ajuda-me a saltar para a vida e a sacudir as tristezas. O tempo pingão parece que ajuda a lágrima a cair. Cria aquela humidade desconfortável que só nos apetece enrolar sobre nós próprias como quem se fecha ao mundo. Hoje apetece-me fechar as cortinas todas e ai de quem espreite cá para dentro! Hoje apetecia-me que, desaparecer um tempo de circulação, fosse possível. Ir para onde ninguém me pudesse encontrar até eu me colocar toda no sítio. Até descobrir as soluções para os meus enigmas. De preferência desaparecia para perto de um mar transparente cheio de vida, acompanhado de um sol forte cheio de luz. Qualquer semaninha me resolvia o problema. Mar, luz, calor e paz. O meu ambiente natural. E com muitos verdes à mistura. Diz que as verduras fazem muito bem à saúde. Eu também acho. 

A minha sorte é que estes ataques não me dão muitas vezes. Nem tenho paciência para eles. Provavelmente amanhã já acordo muito mais bem disposta outra vez. A tristeza não faz parte da minha essência nem do meu estado natural. Mas não deixo de ter enigmas para desvendar nem problemas para resolver…

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