São folhinhas tão simples e tão singelas que ninguém quer saber. Ninguém dá nada por elas.
Talvez 50 cêntimos por um molhinho virado de cabeça para baixo. Para secar. Para durarem mais tempo sem nenhum cuidado especial.
Talvez escondidas atrás da porta da cozinha para que ninguém as veja. Para que não apanhem luz nem incomodarem o olhar.
Para ficarem bem secas e estaladiças. Sem vida. Pobres folhinhas de louro…o estalar de uns enriquece o paladar de outros. Mesmo quando não se dá por isso.
Enquanto um molho de folhinhas tristes de cabeça para baixo, inertes e envergonhadas vão aromatizando o paladar e o mais básico alimento, outros engrandecem-se com coisa nenhuma. A humildade e a versatilidade de uma simples folhinha de louro deveria servir de exemplo para quem tem a barriga grande e não é capaz de apaladar a vida de mais ninguém.
É preciso ter-se um narizinho um bocadinho mais apurado do que um vulgar narigudo metediço para se apreciar o aroma das folhinhas de louro. Também é necessário um paladar que entenda a suavidade e a subtileza da simplicidade para se dar valor às folhinhas de louro cansadas de estarem de cabeça para baixo. É preciso saber-se fechar os olhos e, com a alma, ver-se o sacrifício que alguns fazem para a felicidade dos outros. De forma discreta, quase imperceptível, só por amor e por devoção ao bem-estar da companhia.
Quando se abocanha de forma feroz e ávida, lá passa despercebido o vislumbre da folhinha de louro. O paladar deve ser educado a apreciar as névoas de sabor assim como se deve apreciar os pequenos e discretos rasgos de vida. O aroma da vida deve ser apreciado com a mesma calma e contemplação com que se aprecia o aroma de uma simples folhinha de louro. Quando tudo parece enfiado num caldeirão grande e confuso, a ferver, a requentar, deve desligar-se o lume. Não estragar. Voltar à cozinha, arrumar as ervinhas aromáticas da mesma forma de organizamos a vida. E perceber que uma simples folhinha de qualquer coisa, de cabeça para baixo ou de cabeça para cima, faz toda a diferença num cozinhado. Faz a diferença. Se não for para aromatizar e realçar sabores será para enfeitar, embelezar e abrir todos os nossos sentidos à vida, aos seus aromas, cores e sabores. A vida deve viver-se como se aprecia a comida. Intensamente mas com a calma necessária para degustar cada garfada. Com a delicadeza de se saber distinguir os ingredientes principais dos acessórios. E saber-se igualmente distinguir o papel e a importância de cada um. Com a humildade de se dar Graças a Deus pela refeição.
Na verdade, a vida é um banquete, repleto e farto. Não serve para nada se não for partilhado com alegria, com amor. Com a mesma humildade e o mesmo respeito que um molhinho de folhas de louro merecem. Deixam-se morrer de cabeça para baixo, tal como São Pedro, com a dignidade de quem sabe que a sua importância não depende do seu tamanho mas do alcance da sua essência.
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