Perante o abismo existem 3 opções. Voltamos para trás. Ficamos à sua beira, paradinhos, sossegadinhos, a rezar para não se escorregar e cair ou então refletimos sobre a coisa e tentamos encontrar uma solução. A solução mais indicada. A melhor para nós. Os abismos são sempre muito assustadores. Normalmente muito altos, com muitas escarpas, sem fim à vista. Profundos. E tudo o que não se vê e não se conhece, assusta. São escuros e demasiado silenciosos. Também podem ser escuros e demasiado ruidosos. Depende do tipo de abismo. Ou da forma como se nos apresenta.
Qualquer uma das atitudes face ao que nos parece um abismo requer um determinado tipo de maturidade, estrutura ou de circunstância pessoal. Claro que o encontrar de uma solução é sempre a atitude mais difícil, numa primeira instância. Mas também será a atitude mais resolutiva. Mesmo quando podemos voltar para trás, tarde ou cedo, esse ou outro abismo vai voltar à nossa vida e teremos que o voltar a enfrentar. E os abismos são persistentes e possuem uma força atrativa muito grande - a chamada “atração pelo abismo”. Quando não lhes damos a devida atenção e importância, fazem birras e perseguem-nos. O melhor será olhar para eles de frente, olhos nos olhos. E pensar que são muito grandes e poderosos pelo vazio que encerram. O desconhecido é sempre um vazio que nos enche de medo. E vale a pena refletir no conceito de vazio. Nesta emoção que nos cria angústia e ansiedade. E ao refletirmos sobre esta emoção, estamos em simultâneo a trabalhar esta coisa dos abismos na nossa vida.
Normalmente as soluções para as angústias e para a ansiedade passam por mudanças interiores, no nosso próprio Eu. Se olharmos o vazio como uma oportunidade de lá colocarmos qualquer coisa, talvez o caso mude de figura. Quando a sensação de vazio ataca, quando a barriga se cola às costas, há sempre uma maneira de reverter a situação. Pode não ser de imediato. Por vezes precisamos de estar à beira do abismo e apenas a rezar para não cair. E ganhar segurança nos nossos pés, nas nossas pernas, no nosso equilíbrio. E integrarmos que escorregar e cair, só depende de nós. Que temos a força e a resistência suficientes para ali ficarmos em equilíbrio. O equilíbrio ajuda a acalmar, a refletir, a passar para a atitude seguinte. A reverter a sensação de vazio e a encontrar a ponte, o chão para ultrapassar o abismo.
O vazio pode preencher-se com paz - a tal preciosa paz. Um dos dons que eu persigo incessantemente. A paz vem com o esforço e com dedicação. É uma dedicação que temos que fazer a nós próprios. Vem com oração, com conversas com o Céu, com meditação. Por vezes com o expurgar do que nos assola, do que nos atormenta. Também pode vir com o sol e com o mar. Com a contemplação da natureza. Podemos encontrar a paz de diversas maneiras. Não há receitas. Apenas existem diferentes formas disponíveis e adaptáveis à medida de cada um. Basta querer com muita força, procurar e dedicar-se ao assunto. Encher os vazios com paz permite também que tenhamos tempo para nos amarmos a nós próprios. Para olharmos para dentro com muito amor, muita aceitação e muita tolerância. A paz é sempre mãe do amor e da compaixão. E se formos capazes de sentirmos estas coisas por nós próprios, deixamos de ter medo do nosso interior. Da nossa própria bagunça interna. Dos infinitos que temos por dentro. Dos abismos interiores. Se deixarmos de nos assustar com os nossos abismos interiores, então, não hão-de ser os exteriores, os que se nos apresentam na vida que nos vão fazer mossa. Não senhor. E o que nos causa vazio exteriormente tem que se revertido em paz cá por dentro, em aceitação. A paz, a aceitação, a tolerância e o amor são, cada um em si e todos em conjunto, o que nos tira o medo e nos cria o chão, o solo, para ultrapassarmos os abismos. Um chão seguro que nos transporta para o outro lado. Para uma nova fase evolutiva, mais fortes e mais completos. E os tais abismos birrentos e poderosos ficam muito pequeninos e enfiados na sua vidinha. É verdade. Por vezes as coisas têm o tamanho e a importância que nós lhes atribuímos. Não têm atributos em si próprias. É o nosso olhar que as caracteriza. Que as enfatiza ou que as diminui.
Se de facto tanto parte de nós e do nosso interior, vale a pena começar lá por dentro, arrumando primeiro a nossa casinha, os nossos mundos, preenchendo os nossos vazios. E o nosso olhar vai ficar muito mais cristalino e brilhante e deixam de haver abismos. Apenas caminhos. Oportunidades. Esperanças. Bênçãos e lições. E se do vazio fazemos paz e amor, das dores fazemos forças. Dos abismos fazemos solos seguros e férteis. E evoluímos. Não sei exactamente como é que isto se faz. Mas faz-se. Tem que se fazer. Umas vezes é mais fácil, outras é mais difícil. Mas, até ao dia de hoje, ainda que custe, vou continuando com todo o meu esforço a não me deixar absorver pelos abismos nem pelo vazio. A não desistir. Nem que apeteça muito.
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