A saudade é um ratinho que vai roendo o coração. Este fica
assim como queijo suíço, cheio de buracos, cheio de nada. Cheinho de ausência.
De vazio. E o vazio dói. E os buraquinhos vão crescendo, sendo maiores até já
quase só ficarem as casquinhas do coração.
A saudade é uma malvada. É implacável. Rasga a direito,
sem compaixão. Olha-me nos olhos e desafia-me. Sabe que não há nada que eu
possa fazer para a mandar embora. Para a tornar menos forte, só posso falar
sobre ela. Para que ela saiba o que penso e não a deixar imaginar que é assim
tão poderosa. Isso é que era bom! Não lhe dou esse gostinho, para além de que
se devem separar as águas. Poderosa é a causa que a chamou. É o que está na sua
origem. Ela não. Não tem nenhuma influência sobre mim. Só dói. E trato-a como
trato todas as dores do coração, da única maneira que sei fazer: deixo doer até
não poder doer mais. Até ela querer. Como não luto contra e não a ignoro, a
saudade só pode ser o que é. Não ganha mais força. Não me destrói. Simplesmente
dói.
Às vezes quase que transforma num monte de destroços, o
meu coração de queijo suíço. E depois, lá vou eu, quase até à exaustão e com
muita paciência, colar cada bocadinho destroçado com uma lágrima salgada. E
fica assim mais ou menos colado até à próxima revoada. Até à próxima inundação.
As saudades são imprevisíveis. Umas vezes são constantes, outras vezes fincam
pé, assim como quem espeta um arpão. Um arpão, como se sabe, ao atingir o seu
alvo, não há maneira de sair. É essa a ideia.
E por mais que volte quem está na origem de tamanha
saudade, uma cicatriz sempre fica. Toda a ferida deixa as suas cicatrizes. Por
vezes, as consequências são boas. Para além de ficarmos mais fortes, aprendemos
a valorizar o que não tínhamos ainda conseguido fazer. Percebemos a importância
que afinal aquela pessoa tem na nossa vida. Quanto maior a saudade, maior a
importância. É muito fácil este cálculo de proporcionalidade. É direto, não tem
nada que saber. Quanto mais dói, maior o sentimento. Simples. Doloroso mas
simples.
Uma frase que banalmente utilizamos a propósito de tudo
e de nada é que todas as rosas têm os seus espinhos. É verdade. Mas o universo é
tão justo que até nas maiores dores existem sempre aprendizagens ou lados bons,
mesmo que isso nos custe a aceitar. Mesmo que o preço a pagar seja muito alto.
Por vezes precisamos de sentir a falta do que está ao dispor para podermos dar
o devido valor. Quantas vezes é assim…só na perda é que acordamos para a vida.
Que pena! Porque não pensar, sentir, aproveitar, usufruir das pessoas, coisas e
até do mundo, quando estão à nossa beira?
Porque será que quando estamos tristes é que damos
valor à alegria? E quando temos frio é que nos lembramos como é maravilhoso o
sol? O ser humano é esquisito! Tem uma memória racional curta. Mas esquece-se
que a memória do coração é fortíssima! Cada emoção intensa fica lá cravada. E
vai abrindo, abrindo, enchendo-se de nada até o coração parecer o tal queijo
suíço. E eu, que adoro queijo, nem gosto particularmente do suíço. São crateras
a mais para o meu gosto. Aprecio um queijo bem amanteigado, suave ou intenso
mas bem derretido, bastando para isso haver uma fonte de calor. Nem é preciso
muito. Basta o sol brilhar e o coração derrete. Perdão, o queijo é que derrete!
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